Era uma radiosa manhã de
primavera. O sol brilhante iluminava as ruas estreitas e
pitorescas de Florença, projetando uma profusão de luz no
gabinete de trabalho de um dos mais famosos pintores de
Toscana, André Verrochio. Um rapaz muito pálido,
curvado sobre seu cavalete, parecia completamente absorvido
no trabalho. Sua nobre flauta era envolta por densa nuvem de
tristeza.
De repente o jovem pintor foi
interrompido. Uma mulher idosa, entrando no aposento, lhe
disse com voz cheia de emoção:
– Meu filho, o mestre deseja
vê-lo. Vá logo ter com ele.
Imediatamente, Leonardo deixou
a palheta e os pincéis, e dirigiu-se ao quarto do seu
venerando mestre, que se encontrava entre a vida e a morte.
– Leonardo, disse-lhe o
doente, com voz muito sumida, estou prestes a morrer; quer
fazer-me um favor? É o último pedido que lhe faço.
O jovem ajoelhou-se junto do
leito de seu mestre, tomou entre as suas mãos a mão trêmula
que se lhe estendia e respondeu com forte emoção:
– Meu mestre, para satisfazer
um desejo seu eu irei aonde você quiser e tudo farei; não há
sacrifício algum que me pareça grande demais, se eu o fizer
pelo amor que tenho a você.
O doente fixou os olhos baços,
durante algum tempo, nos de seu discípulo e depois disse:
– Leonardo, o trabalho que eu
comecei para o altar do claustro de São João, você poderá
acabá-lo por mim?
Leonardo baixou os olhos e,
depois de alguns instantes, disse:
– Mestre, não sou capaz,
absolutamente não sou capaz! Eu estragarei a sua obra se
nela tocar.
Verrochio
sorriu e disse com voz calma e nítida:
– Não, meu filho, faça o
melhor que puder. Trabalha por amor a mim. A pintura precisa
de ser acabada e você podes fazê-lo.
A tarde descia com suas
sombras melancólicas. De uma pobre casebre de Florença
começou a subir para o céu a súplica de um coração ardente:
"Meu Deus, dizia Leonardo – porque era ele que se encontrava
de joelhos – ajuda-me por amor de meu mestre a fazer o
melhor que eu puder! Não sou digno dessa obra, bem o sei,
mas auxilia-me por amor dele."
Passou-se um mês – período de
sérias aflições para o jovem artista – pois ele sentia que a
hora da partida de seu mestre se aproximava rapidamente.
Afinal concluiu a pintura e apresentou-a ao doente, dizendo:
– Eu fiz o que pude, meu
mestre, e tudo por amor a você!
Com grande admiração o bom
velho, derramando lágrimas, respondeu-lhe, agitado por
grande emoção:
– Meu filho, meu filho, você
triunfou, e muito bem. Não preciso voltar mais ao trabalho e
Florença orgulhar-se-á um dia do nome de Leonardo da Vinci!
– Respigando.